marias varbova
Sempre achei, quis, soube, que quando tivesse 50 anos ia ser uma rapariga em forma, pronto ok, uma mulher em forma. Sempre desejei, imaginei para mim, uma saúde-inteligente, fisica e emocional. Eu sofro, como qualquer outra pessoa, mas acho mesmo, estou profundamente convencida, que não nasci para sofrer e por esssa razão procuro a “facilidade” em tudo na minha vida, cada vez mais. Claro está que ser saudável, é muito mais “fácil” de se viver do que a doença, digo eu e é também e praticamente “só” por isso que nunca larguei a ideia da saúde como base para a felicidade. Aquela que todos, mas todos, queremos e procuramos.
Sou daquele tipo de pessoas que deixa sempre tudo para o fim, para o último momento. Tenho um grande problema, desde sempre com o raça da disciplina, que tanta falta me fez em alguns momentos na vida. Não há cá ir fazendo aos poucos… Um bocadinho de cada vez, custa menos… Nada disso. A mim todo esse modo de ser me parece mais o prolongar da chatice ou do sacrifício e enquanto o sinto assim, não descanso enquanto não acabo com ele. Houve mesmo quem visse essa falta como preguiça, nunca foi. Como teimosia, também não ou como soberba ou falta de humildade… Há quem de tão disciplinado, tramado e condicionado, acho eu, se sinta ofendido com o descaramento com que eu evito condicionar a minha criatividade, a minha liberdade, de expressão da minha pessoa, da verdade, do que afinal sempre me condicionou, o MEDO. Medo esse que me faz procrastinar o tempo todo num modo de fuga do que mais não é senão uma forma de ansiedade, da qual preciso me afastar (ninguém gosta, não é?). Mas medo de quê? De tudo um pouco… Medo de a “obra” ser maior do que o “artista”, Medo de não estar à altura da vida em geral, Medo de me encontrar desprotegida, Medo de ter Medo, Medo idiota, irracional e castrador. Durante anos senti-me como se estivesse sempre no fim da cadeia-alimentar, a precisar de sobreviver… Crédo! Tanto assim? Questionei-me eu, quando lá para os quarenta percebi isso de mim. Mas se afinal és tão corajosa… Mas se afinal és tão forte… Mas se afinal és tão de confiança… Já podes olhar para trás e ver que sim… Por que é que antecipas tantos cenários, imaginas e despistas coisas para o qual sentes necessidade de te preparar, mesmo achando que não vão acontecer, ainda assim? Não sei porquê, acho que nunca vou saber. Mas sei cada vez melhor, reconhecer como funciona e cada vez mais, sei também parar e “contrariar” o impulso que me leva para a “paranóia” do que às tantas vivia, como se estivesse a acontecer, mais forte e intenso do que a própria realidade, também ela tão intensa, original, de responsabilidade e desafiante e que me intensificava as certezas das possibilidades que me pareciam “tão prováveis” (às vezes ainda parecem) e que embora quase nunca se realizem assim, tinham o poder de quase acabar comigo e por isso a necessidade de me salvar. Uma canseira interna, que sempre fiz “naturalmente” e com aparente facilidade, sem que me apercebesse o quanto é injusto e desnecessário viver assim.
Bem, mas nem tudo é assim difícil ou mau. Eu cumpro prazos, ah isso cumpro. Por respeito ao compromisso que faço com alguém, comigo ou com a vida em geral. Sou muito leal aos compromissos e por isso pode-se dizer que sou uma rapariga muito responsável, mulher vá, muito responsável.
Dizia eu que sempre achei, quis, soube, que quando tivesse 50 anos ia ser uma rapariga em forma, pronto ok, uma mulher em forma. Imaginava mesmo que, podia facilmente chegar à conclusão que aos 50, estaria melhor do que aos quarenta, ou mesmo aos trinta.
Nunca fui adepta de desportos, mas o medo da doença (não confundir com a mania da doença), levou-me sempre a procurar informação de práticas saudáveis e naturalmente sobre a importância do exercício físico. Foi por isso que durante anos, sonhei com a capacidade de fazer yoga de uma forma disciplinada e integrada na minha vida de um modo prazeroso e fácil. Li tudo sobre o assunto, vi e senti como faz sentido e como o yoga vai muito para além do exercício físico. Respirar, foco, alongar, resistência, como isso me interessa e como me faria bem… Experimentei aulas, umas duas vezes, poucas aulas de cada vez. Descobri os ritos tibetanos, 5 exercícios mais simples de executar, para praticar todos os dias. Pouco tempo e fácil, o que é que eu poderia querer mais? Descobri, pratiquei, fartei-me, não teimei… Era só o que faltava! Não nasci para sofrer… Pelo meio tive a fase da corrida, que me salvou literalmente de uma depressão que corajosamente enfrentei, quando (me) (a)percebi dela. Ok já não me apetece, porque carga de água vou andar eu a perder o fôlego, com os bofos de fora e a doer-me as pernas, para trás e para a frente, agora que me sinto tão bem? Chega, acabou.
Eu cá sou daquelas que não sente necessidade de ir a lado nenhum, de tão bem que me sei sentir onde escolhi estar a fazer outra coisa qualquer do meu tempo livre, como por exemplo ler ou ver documentários ou conversar ou “apenas” discorrer. Não, não nasci para sofrer e gostos não se discutem, não é? Mas será possível que não exista um desporto-exercício-físico-que-me-dê-prazer-fácil-ainda-que-quem-sabe-trabalhoso e já agora que-até-me-torne-disciplinada-com-todo-o proveito-que-imagino-possa-daí-resultar?
Lá para os quarenta e poucos, quando andava numa correria entre desgostos e medos e responsabilidades mais do que nunca, conheci uma rapariga num grupo de mulheres (às vezes aparecia um homem), que se encontravam uma vez por mês e que literalmente me abraçaram e deram colo. A V., já não me lembro porquê acabou por ir comigo inscrever-me nas piscinas municipais, que dizia ela eram fantásticas e baratas.
– Vens comigo e vais ver que é muito bom! Ficas em forma num instante. Precisas de pouco. Eu há uns anos ia nadar todas as semanas e vi o meu corpo mudar muito rapidamente, garantiu-me ela. Num mês, se fores regularmente (pois…), vês resultados.
Assim, numa tarde de sol, lá fui eu e a V., que só tinha visto umas duas ou três vezes na vida, para a piscina municipal do Restelo de touca e óculos (por indicação dela e que diferença que faz!).
– Ok, diz-me ela em modo despachado. Sabes nadar, não sabes? Gostas mais de qual estilo? Nenhum em especial? Mas qual é o que para ti é o mais fácil? Ah, bruços. Ok, vais nadar só bruços. Podes começar. Fazes 30 piscinas e pronto, é sempre assim. Três vezes por semana e ficas em forma.
– Ahahahahaha, ri-me eu de nervos. 30? Ahahahaha, mas alguma vez eu consigo nadar 30 piscinas?
– Consegues sim, respondeu ela muito séria, mas se quiseres agora nas primeiras vezes nadas “só” 20 e depois aumentas. Vá começa que eu ainda tenho que fazer uma data de coisas hoje e não me posso atrasar.
– Ah, ok, ok, desculpa… (20… bonito serviço, menos mal que é só de bruços…).
Nunca mais foi comigo, não foi preciso. Fiquei tão espantada com a minha impensável capacidade de fazer 20 piscinas, muito motivada por querer corresponder à generosidade dela em ir comigo e ao desafio que senti e que de feitio gosto, que rapidamente nas vezes seguintes passei para as 30, número mágico da V. para ver o corpo mudar, que mudou.
Andei assim uns tempos, meses, noutra piscina municipal, duas vezes por semana à hora do almoço, perto do trabalho que tinha na altura e que me ocupava de de lua a lua. Depois veio o frio e eu em forma e com o meu instinto de hibernação, que todos os inícios de Inverno tenho de contrariar, nunca mais fui. Ah e tal, está frio. Uma chatice, o cabelo sempre molhado, ter de secar, despir, vestir… Frio. Agora está calor demais, tenção baixa… Apetece-me pelo que sei que representa, mas não me apetece ter de ir e passar por isso. Não nasci para sofrer. Nunca mais fui.
Estaria a mentir se dissesse que lido livre e feliz, cheia de auto-estima com a minha indisciplina. Fico sempre com a pulga a viver atrás da orelha, que não morde mas está lá e que vou dando por ela. São assuntos mal resolvidos que não me largam porque acredito na importância deles e só por isso (ai o Festinguer). Nunca pelo que poderá parecer, de desistências ou inconstâncias, quero lá saber do que parece. Não nasci para sofrer.
Tudo isto se passou, com muitas mais histórias pelo meio, mais desportos até. Quando finalmente, no início do mês passado de Fevereiro, de repente, a Pulga mordeu-me e lembrou-me o que eu sempre soube:
– o tempo antes de fazeres 50 anos está a acabar… É que, lembras-te? Fazes anos a 29 de Abril e por isso faltam, menos de três meses… Estás com uma catrefada de quilos a mais. Estás na Perimenopausa, que para quem não sabe é o começo de uma data de chatices que vão desde a dificuldade em manter o peso até ao feitiozinho exacerbado, que no meu caso, por um lado levo vantagem de ter nascido e sido a “Pulga” magricela, mas por outro o feitiozinho, digamos que não é mau mas sempre foi, muito… Enfim, podemos andar anos nisto, tal e qual uma “adolescência” tardia.
– O relógio está a contar, literalmente a olhos vistos e eu sei que tu sabes e que nos espreitas assim pelo canto do olho, rematou ainda a Pulga de trás da orelha.
“Burro velho não aprende línguas” e a facilidade para mim continua mais do que nunca a ser a minha prioridade. Principalmente porque sei, está visto, que só assim é que sou verdadeiramente feliz. Pode ser trabalhoso? Pode, mas tem de ser fácil e isso é uma coisa, já se sabe muito subjectiva… Ora deixa cá ver, fácil para mim neste caso é: Ambiente simpático; Ter pouca gente; Água quase-quente, um bocadinho mais do que morna; Balneários impecáveis. Fácil de estacionar: Perto do “meu” bairro, para onde vou todos os dias, respirar a calma das árvores que me pertencem, enquanto faço TOSCOS : )
Tudo certo. Existe uma piscina assim. Pago um bocado mais do que pagaria nas óptimas piscinas municipais e que aconselho, mas compenso com outro facto da minha já longa vida de rapariga a fazer 50 anos… Há tempos, por necessidade, deixei de comprar roupa e passei a receber de uma amiga querida a roupa dela que já não lhe “servia”. Como se faz às vezes com a roupa de irmãos ou de primos. Correu bem e mais tarde perdido o impulso, vicio, de entrar em lojas de roupa e andar ano após ano, em cada início de estação, atrás das “tendências de moda”, descobri as lojas da Humana e passei a vestir-me praticamente só de lá. Cada estação, um dia especial de 1 ou 2 euros a peça, gozo, paciência, “olho” e noção de estilo e de mim, 25 peças de marcas conhecidas, 25 euros. Hoje, nem de propósito e juro que não estou a inventar, uma senhora com sotaque de estrangeira, nos balneários volta-se para mim e diz: – desculpa… Sabe me dizer, onde comprou essa camisola. O meu cérebro deu um nó e eu fiquei, qual estrangeira também eu, a tentar medir as palavras e decidir o que dizia (digo, não digo? Será que vai entender?…) Ali fiquei de boca aberta qual peixe fora de água, até ela ir em meu socorro e ouvi-la dizer: – Já foi há algum tempo, é isso? Não se lembra? Não faz mal. – É isso, sim… Respondi eu : )
Sempre achei, quis, soube, que quando tivesse 50 anos ia ser uma rapariga em forma, pronto ok, uma mulher em forma e como sou uma Rapariga que me responsabilizo pela minha saúde-facilidade-felicidade, a três meses dos 50 anos, fui a correr inscrever-me numa piscina, com um passe livre e passei a nadar 40 piscinas, 4x por semana e 2 a 3 aulas de hidroginástica.
Estou lá há quase 2 meses e mais do que tudo estou a adorar de tão fácil que está a ser. O corpo mudou e mais do que o desafio que poderia motivar-me, até me fartar… O que aconteceu foi o que sempre desejei, exercício-fisico-que-me-dá-prazer-fácil-ainda-que-trabalhoso-e-que-até-me-torna-disciplinada-com-todo-o proveito-que-daí-resulta. Quase a fazer 50 anos até que enfim!
* Não faz mal porque eu não gosto de papas e prefiro o sal, que se for do bom até nem faz mal.